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Em documento encaminhado à presidente Dilma Rousseff, CONSEA afirma que país não tem respeitado o princípio da precaução e posiciona-se contra a liberação do feijão transgênico
Leia abaixo a íntegra da Exposição de Motivos do Consea, de 07 de julho de 2011
Excelentíssima Senhora Presidenta da República,
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), reunido em plenária no dia 15 de junho de 2011, discutiu e fez proposições relativas à atuação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) a respeito da liberação de Organismos Vivos Modificados (OGMs). De acordo com o artigo 4° da Lei n° 11.346/2006, a segurança alimentar e nutricional abrange a conservação da biodiversidade, a utilização sustentável de recursos, a promoção da saúde, da nutrição e da alimentação da população, bem como a garantia da qualidade biológica, sanitária, nutricional e tecnológica dos alimentos, e seu aproveitamento, estimulando práticas alimentares e estilos de vida saudáveis que respeitem a diversidade étnica e racial e cultural da população.
O Decreto n° 7.272/2010, que instituiu a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, estabelece como uma de suas diretrizes a promoção do abastecimento e estruturação de sistemas sustentáveis e descentralizados, de base agroecológica, de produção, extração, processamento e distribuição de alimentos.
Diante do marco legal supracitado e do compromisso internacional firmado pelo Governo brasileiro na Convenção sobre Diversidade Biológica e no Protocolo de Cartagena, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) avalia que o país não tem respeitado o Princípio da Precaução, base fundamental da Agenda 21, em suas decisões referentes a temas de biossegurança. Razão pela qual este Conselho entende que é necessário adequar as políticas internas de biossegurança aos preceitos da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento - Rio 92.
Particularmente, o Consea manifesta preocupação com a atuação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), relativamente ao Princípio da Precaução, ao tempo em que lamenta as violações ali cometidas, tanto em relação à Lei de Biossegurança quanto a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. Com efeito, a CTNBio alterou o regimento do seu colegiado em maio do corrente ano a fim de reduzir para 30 dias o prazo formal concedido aos avaliadores de processos, envolvendo pedidos de liberação comercial de Organismos Vivos Modificados (OGMs), para emissão de seus pareceres argumentados. O prazo mínimo anterior, de 90 dias, que já se mostrava insuficiente para a avaliação cuidadosa dos volumosos processos, como indica o tempo médio a eles dedicado pela maioria dos membros daquela Comissão, tornar-se-ia o prazo máximo se não houvesse a intervenção do Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia (MCT) Aloizio Mercadante Oliva na questão. O Consea parabeniza a decisão do Ministro de rejeitar a redução dos prazos bem como de defender a pluralidade do debate e a transparência da atuação da Comissão.
Nos próximos meses, a CTNBio pretende alterar sua Resolução Normativa n° 5, que trata de pedidos de liberação comercial de OGMs. Entre as alterações propostas, incluem-se a exclusão de exigências de estudos de longo prazo (plurigeracionais), a exclusão de estudos com animais em gestação, e o estabelecimento de regramento facilitador ao processo de monitoramento pós liberação comercial. Alerta-se ainda que as últimas liberações foram aprovadas por voto de maioria dos membros da CTNBio, sem, contudo, haver a apresentação dos estudos acima referidos, que constam como obrigatórios na norma ainda em vigor.
O feijão “GM EMBRAPA 5.1”, cuja liberação comercial está sendo proposta, apóia-se em estudos insuficientes. O processo não apenas ignora a necessidade de estudos de consumo de longo prazo e com animais em gestação, como também apresenta escassa análise de fluxo gênico, examina aspectos ambientais somente nos estados de Goiás, Minas Gerais e Paraná, e ainda admite desconhecimento sobre as razões de funcionamento do gene inserido, entre outros. Sabendo que a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Arroz e Feijão vem realizando há oito anos experimentos com cultivo orgânico de feijão sem que ocorra a infestação das doenças causadoras do vírus do mosaico dourado e sem comprometer a produtividade, entende-se que não há necessidade justificada de investir na pesquisa e na liberação comercial desse feijão transgênico, que certamente será demandador de uso de agrotóxicos.
Considerando, ainda, que a liberação deste OGM levaria à gradativa eliminação das variedades em uso e à perda de soberania dos agricultores e consumidores locais, e que a própria Embrapa possui um rico acervo de variedades de feijão, que até mesmo deveriam ser disponibilizadas aos agricultores familiares, o Consea posiciona-se contrário à liberação do feijão transgênico.
Assim, considerando que a CTNBio aprovou todos os pedidos de liberação comercial a ela apresentados, percebe-se que a referida Comissão assumiu um caráter de entidade facilitadora das liberações comerciais de OGMs no Brasil, em situação que rotineiramente contraria os votos e despreza os argumentos apresentados pelos representantes da agricultura familiar, dos consumidores, dos Ministérios da Saúde, do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Agrário, os quais defendem claramente o Princípio da Precaução.
Diante disso, o Consea solicita a especial atenção de Vossa Excelência para as implicações e possíveis desdobramentos desta circunstância. Adicionalmente, o Consea solicita a possibilidade de indicar nomes de especialistas para compor as subcomissões que tratam da saúde humana e animal e das questões vegetal e ambiental na CTNBio, e que estes especialistas sejam incluídos entre os 12 nomes indicados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.
Pelas razões expostas acima, o Consea apresenta as seguintes proposições à Vossa Excelência: 1. Proibição da liberação comercial do feijão transgênico e demais Organismos Vivos Modificados (OGMs); 2. Ampliação dos prazos concedidos aos processos de avaliação dos Organismos Vivos Modificados (OGMs); 3. Participação de representante do Consea na composição da CTNBio.
Concluímos que o momento é bastante oportuno para avançar na implementação dessa solicitação junto aos órgãos responsáveis a fim de assegurar de fato o Direito Humano à Alimentação Adequada e a segurança alimentar e nutricional da população.
Respeitosamente,
Renato S. Maluf
Presidente do CONSEA
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