Teste de campo já havia ocorrido apesar de declaração oficial informando adiamento
Em 14 de janeiro divulgamos a notícia de que o governo da Malásia havia decidido adiar a autorização para testes de campo envolvendo a liberação de mosquitos transgênicos no meio ambiente. A notícia havia sido repercutida por importantes veículos de comunicação de diversos países.
A técnica consiste em liberar no meio ambiente milhares de machos transgênicos da espécie Aedes aegypti, que na teoria irão cruzar com fêmeas que carregam o vírus da dengue e gerar descendentes estéreis, que morrerão antes de chegar à fase adulta. É um tipo de mosquito terminator, e seus proponentes alegam que com sua continuada introdução no meio ambiente será possível reduzir a população dos mosquitos e com isso baixar a incidência da doença. Existem, entretanto, diversos questionamentos científicos em relação à segurança do novo método e a proposta tem sido alvo de duras críticas em todo o mundo.
A notícia do adiamento dos testes na Malásia há poucas semanas foi interpretada como uma vitória de um grupo de organizações da sociedade civil que tem alertado sobre os riscos do experimento. Este grupo havia protocolado junto ao governo, em 21 de dezembro de 2010, um documento pedindo que nenhuma liberação de mosquitos transgênicos ocorresse sem que houvesse transparência na avaliação dos impactos para o meio ambiente e para as pessoas, o que incluiria a realização de consultas públicas e a obtenção do consentimento prévio da população local.
Para a surpresa geral, entretanto, nesta quarta-feira (25/01) o Instituto de Pesquisa Médica (IMR, na sigla em inglês), órgão vinculado ao Ministério da Saúde da Malásia, divulgou um comunicado informando que liberou no mês passado 6 mil mosquitos transgênicos em uma floresta perto de Bentong, para testar seu alcance de vôo e habilidade de sobrevivência no meio ambiente. Segundo o comunicado, a liberação ocorreu em 21 de dezembro e o experimento foi concluído em 05 de janeiro. A área foi então pulverizada com inseticida e, segundo o IMR, será monitorada por até dois meses.
Organizações da Malásia e de outros países mostraram-se chocadas com a informação e repudiaram a postura pouco transparente do IMR.
“Estou surpresa que eles tenham feito isso sem antes informar a sociedade, dado o alto nível das preocupações levantadas não apenas pelas ONGs, mas também por cientistas e pela população local”, declarou à AFP Lim Li Ching, da ONG Third World Network. “Não concordamos com este experimento que foi conduzido com tamanha falta de transparência. Há muitas dúvidas e não foram feitas pesquisas suficientes para avaliar as suas consequências”.
Em outro comunicado, duas associações de consumidores da Malásia, a Consumers Association of Penang (CAP) e a Sahabat Alam Malaysia (SAM) também se declararam chocadas: “(...) [A liberação dos mosquitos] ocorreu apesar das declarações de autoridades do Departamento de Biossegurança em janeiro de 2011 dizendo que os experimentos haviam sido adiados. Lamentamos a falta de transparência no tratamento da questão, em particular a forma com que o IMR divulgou seu comunicado, mais de um mês depois do início do experimento. Considerando que a liberação de mosquitos transgênicos no meio ambiente atraiu tantas críticas, condenamos a maneira aparentemente secreta com que os testes foram conduzidos. Tal comportamento não alivia de maneira nenhuma os medos e preocupações da sociedade (...)”.
Porém, talvez ainda mais lamentável do que o fato de o IMR ter iniciado o experimento secretamente e informado o público somente a posteriori, é a reação às críticas que está recebendo agora. Segundo reportagem publicada pelo Free Malaysia Today, um funcionário do alto escalão do Ministério do Meio Ambiente da Malásia declarou que “as autoridades não estão preocupadas com o clamor público”: “A decisão foi tomada pelo Conselho Nacional de Biossegurança, não importa se o público gosta disse ou não”, teria dito o funcionário, pedindo anonimato.
O mais interessante é que, apesar de recorrentemente comportarem-se desta maneira, com soberba, falta de transparência e, em grande parte dos casos, absoluta falta de rigor científico, órgãos encarregados por avaliar a biossegurança de organismos transgênicos querem que acreditemos em sua seriedade e responsabilidade, que fiquemos tranquilos (e passivos), pois eles “sabem o que fazem”. Simples, não?
Com informações de:
- Free Malaysia Today, 26/01/2011.
- Consumers Association of Penang, 26/01/2011.
- The Sun Daily, 27/01/2011.
- AFP, 26/01/2011.
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