Em pratos limpos
Dois problemas que afetam a produtividade das lavouras de soja no Brasil têm desafiado os pesquisadores atualmente – um novo tipo de anomalia conhecido como Soja Louca II e a resistência das chamadas super ervas daninhas aos produtos utilizados em associação com o glifosato, um dos herbicidas mais utilizados no mundo
Em casos mais extremos, ambos podem provocar perdas de cerca de 50% da produção.
A Soja Louca II vem sendo tratada como uma anomalia, mas sua causa ainda é desconhecida. Quando ocorre, a planta não amadurece e registra alto índice de abortamento de flores e vagens. Em outros anos foram registradas ocorrências no final do ciclo de desenvolvimento da soja, mas nesta safra ela surgiu mais cedo, no começo da fase vegetativa, e preocupa principalmente em áreas mais quentes, com casos no Maranhão, Tocantins, Pará e norte de Mato Grosso, o principal Estado produtor.
“Normalmente é nas folhas mais novas que ocorrem os sintomas mais fortes. Elas ficam deformadas, as flores caem, não vingam e não produzem vagens. Isso nos ajuda a entender o problema, porque aparentemente a anomalia se instala na parte mais nova da planta”, explicou à Agência Estado Mauricio Meyer, pesquisador da Embrapa Soja, que coordena as pesquisas sobre a doença.
De acordo com Meyer, o problema da Soja Louca II vem aumentando de forma gradual e consistente desde a safra 2005/06, mas foi neste ano que começou a ficar mais preocupante.
Em parceria com outras instituições de pesquisa e cooperativas, a Embrapa montou unidades de observação e um questionário para tentar entender o momento e a situação em que a anomalia aparece, os sintomas e o histórico da área, como por exemplo algum manejo ou procedimento que estaria favorecendo o surgimento do problema.
O pesquisador explica que as observações já realizadas indicam que a anomalia provavelmente não está ligada ao uso de herbicidas. “O problema tem aparecido em várias formas de manejo de herbicidas. Talvez tenha alguma ligação com algum tipo de planta invasora que aparece na entressafra. Temos agora que ver como é transmitido de alguma erva daninha para a soja”, disse ele, explicando que soube de relatos esparsos sobre a Soja Louca II na Costa Rica e nos Estados Unidos, mas que não sabe de nenhuma estratégia de controle. “Parece que estamos sendo pioneiros (nos estudos)”.
Apesar de não ter como comparar com danos provocados em outros anos devido à falta de informações, Meyer calcula que, nas áreas onde já ocorre a doença, houve uma redução de produtividade de 40% a 60%. “É uma preocupação muito forte porque a ocorrência tem aumentado, e isso vem diminuindo a produtividade consistentemente”.
Resistência
No que se trata de ervas daninhas, a preocupação agora é com a solução encontrada para controlar a resistência das chamadas super ervas daninhas ao glifosato, um dos herbicidas mais importantes na agricultura.
No Brasil já foram registradas cinco dessas plantas resistentes: o capim amargoso (digitaria insularis), o azevém, o amendoim bravo e dois tipos de buva, esses os mais preocupantes por serem um tipo de erva que está espalhada pelo Paraná e pelo Rio Grande do Sul, Estado pioneiro no uso de soja transgênica tolerante ao glifosato.
Para controlar a resistência dessas plantas ao glifosato, a solução encontrada foi utilizar outros produtos parceiros, como herbicidas graminicidas, inibidores da ACCase ou da ALS, dependendo da planta. E se a preocupação antes era com o uso errado do glifosato, agora é com a utilização indiscriminada desses produtos, já que as ervas daninhas também podem ampliar a resistência a eles. “Existe um risco iminente de essas ervas que já têm resistência ao glifosato criarem resistência também a esses produtos que estão sendo a solução. Se não controlarmos muito bem o uso desses produtos, eles serão perdidos”, explicou Dionisio Gazzieiro, pesquisador da Embrapa Soja, a estatal brasileira de pesquisa agrícola.
Segundo ele, as perdas de produtividade nas lavouras de soja no caso da infestação pela buva chegam a até 50%. A solução para a resistência em ambos os casos passa pelo manejo adequado das lavouras, por meio da rotação de culturas e do próprio herbicida, tomando cuidado para que as indicações de uso sejam seguidas, como o momento ideal de aplicação e a quantidade. “Não existe uma solução mágica. O que existe é uma conscientização dos agricultores com boas práticas. O importante é não perder a molécula do glifosato, que viabiliza o plantio direto e é extremamente barata”, disse Julio Negreli, gerente de estratégia de proteção de cultivos da Monsanto, empresa que desenvolveu a soja, o milho e o algodão transgênicos tolerantes ao glifosato.
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