É preocupante a quantidade de artigos em todos os meios de comunicação, principalmente os virtuais, apregoando que existe uma conspiração malévola com o objetivo de implantar o comunismo no Brasil. No início, eu apenas ri e não dei muita importância, certo de que tais ideias logo seriam ridicularizadas, eis que em pleno século XXI, não era crível que as pessoas, diante da quantidade de informação à que têm acesso, iriam levar a sério tais afirmações.

Infelizmente eu me enganei. Apesar de todas as possibilidades de colocarmos luz sobre qualquer alegação de tal natureza, ainda existem pessoas que acreditam ingenuamente em teorias de conspiração sem ao menos questioná-las, acabando por contribuir sem querer para o triunfo de ideologias retrógradas que visam se sobrepor à realidade dos fatos.

Tudo indica que tais afirmações estapafúrdias advêm de pessoas temerosas de perderem seus privilégios que, acostumadas com um povo submisso, assustaram-se ao ver que ele passou a pensar, falar, progredir e ascender socialmente, conforme afirma o teólogo, filósofo e escritor Leonardo Boff. O próprio Presidente da República é o exemplo mais simbólico de tal afirmação.

Acontece que isso apavora aquelas classes privilegiadas que praticamente dominaram o Brasil desde a sua invasão e elas reagem fazendo o jogo sujo a que estou me referindo. Afinal, povo que melhora suas possibilidades de comer melhor, estudar, ganhar um salário mínimo maior do que trezentos dólares e passa a querer decidir seu próprio destino torna-se perigoso. Assim sendo, nada melhor do que um bom retrocesso histórico através da criação de um concerto ficto consubstanciado em um complô comunista.

Para tanto, passaram a divulgar a ideia de que o grande objetivo das forças de esquerda do País é implantar no Brasil um regime comunista no moldes da China e da antiga União Soviética. Ora, até aonde eu sei sobre o assunto, em nenhum destes países existiu o comunismo em sua mais pura acepção. Neles o que tivemos foram estados com algumas características socialistas, e que mais tarde se tornariam, na maioria dos casos, os principais exploradores da mais-valia dos operários.

A realidade é que, ao contrário do que ocorreu nos países citados, o comunismo prevê, não a estatização, mas sim a socialização dos meios de produção, com operários trabalhando de forma autogestionária. Os doutrinadores afirmam que o "comunismo puro", no sentido marxista refere-se a uma sociedade sem classes, sem Estado e livre de opressão, onde as decisões sobre o que produzir e quais as políticas devem prosseguir são tomadas democraticamente, permitindo que cada membro da sociedade possa participar do processo decisório, tanto na esfera política e econômica da vida.

Uma das poucas referências históricas a respeito de uma experiência de caráter comunista, foi a Comuna de Paris que, diga-se de passagem, deu certo enquanto durou, já que em seguida foi aniquilada pela força das armas dos conservadores.

De qualquer forma, aquilo que no início nos pareceu uma alegação anacrônica, ridícula e de mau gosto, está tomando uma dimensão inesperada, fruto inclusive de manipulação das mais diversas mídias. Só está faltando eles dizerem novamente que os comunistas come criancinhas.

Pessoas de minha idade, já viram este filme antes, lá pelo início dos anos sessenta, época em que classes conservadoras formadas por empresários, banqueiros, igreja católica, militares e classe média, assustadas com o fato de que trabalhadores, estudantes e organizações populares estavam ganhando muito espaço durante o governo do Presidente João Goulart, criaram a falsa ideia de que o Brasil estava dando uma guinada para o lado comunista.

Assim sendo, após João Goulart ter realizado no dia um enorme comício na Central do Brasil, Rio de Janeiro no dia 13 de Março de 1964, onde defendeu as Reformas de Base prometendo mudanças radicais na estrutura agrária, econômica e educacional do país, eles não tiveram dúvidas; no dia 19 de março do mesmo ano, organizaram a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, reunindo milhares de pessoas nas ruas do centro da cidade de São Paulo.

Toda essa pressão culminou com o golpe de estado desencadeado pelos militares no dia 31 de Março de 1964. Como resultado, tivemos mais de vinte anos de estagnação em todos os setores da nossa sociedade, principalmente no campo político, cultural e social.

Portanto, há que se ter cuidado com as ridículas alegações das forças retrógradas e iniciarmos uma campanha esclarecedora, deixando explícitas as reais intenções subjacentes a elas e as conseqüências nefastas que poderão advir.

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS

Revisado por André Vinicius Jobim, especialista em História pela UFSM.